Queimação e azia são sensações terríveis para os adultos. Imagine, então, como isso é recebido por uma criança? Pior ainda, pelos bebês! Tão comum nos primeiros meses de vida (especialmente até o 6o mês), o refluxo nada mais é do que a volta do alimento, sólido ou líquido, do estômago para o esfôfago. Simples assim, mas que incomoda e muito nossos pequenos.

Mesmo sabendo acontece com frequência, e que em 80% dos casos desaparece com o passar do tempo, sem precisar de qualquer medicação, o refluxo ainda é temido por 10 em cada 10 mamães. Afinal, dele podem surgir outras complicações, como a indesejada – e perigosa! – “perda de peso” da criança.

Por isso a equipe KIDS in resolveu tirar todas as suas dúvidas com um especialista, o Luiz Henrique Hercowitz, Gastroenterologista Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

Entrevista

KIDS in – Como diferir o refluxo da regurgitação considerada “normal”? Isso se avalia em termos de volume e tempo após a mamada?

Dr. Luiz Henrique – Considera-se Refluxo Gastro Esofágico (RGE) todo o retorno de conteúdo do estômago para o esôfago, podendo ser eliminado ou não, através da  boca, independentemente do volume ou tempo após as mamadas.

K – O que causa o refluxo? Apenas o tipo de alimento ou a postura/posição do bebê também?

Dr. – O refluxo fisiológico é uma ocorrência normal e não prejudica a criança. Ocorre devido à imaturidade do sistema que deveria bloquear a volta de alimentos do estômago para o esôfago. A postura pode favorecer o aparecimento ou, em caso contrário, melhorar a ocorrência desses episódios. Com a idade e o amadurecimento deste sistema, também tende a melhorar o RGE. Quanto ao tipo de alimento, esse naturalmente deve ser, nos primeiros meses, o leite materno ou, na sua impossibilidade, fórmulas lácteas, em geral, tendo como base a proteína do leite de vaca. A ocorrência de RGE é maior evidentemente em crianças com menor idade, consequentemente, amamentadas com leite. Com a introdução de alimentos mais espessos, que coincidem em geral com crianças de maior idade o RGE tende a diminuir e desaparecer.

 

K – O refluxo pode ser causado também por alguma alergia (como APLV)?

 Dr. – Sim, o RGE pode ser uma manifestação (frequente) de alergia alimentar.

 

K – Quando desconfiar que o refluxo é sintoma de alergia à proteína do leite de vaca?

Dr. – O RGE por alergia à proteína do leite de vaca frequentemente causa a doença do RGE com sintomatologia variável, como dificuldade alimentar por dor, alterações alérgicas na pele, evacuações de fezes com muco ou sangue, quadros respiratórios frequente, etc.  Não se pode também desprezar a ocorrência de antecedentes alérgicos na família.

 

K – O refluxo pode estar diretamente ligado à alimentação da mãe?

Dr. – Pode sim. Se a criança for alérgica a algum alimento ingerido pela mãe, a passagem de frações protéicas desse alimento pelo leite materno pode provocar o aparecimento do refluxo.

 

K – E pode também estar relacionado a problemas respiratórios, como asma e rinite?

Dr. – Sim, nesse caso o RGE passa a ser chamado de doença do RGE (DRGE).

 

K – O refluxo tende a melhorar com a introdução de outros alimentos além do leite materno, como frutas e papinhas?

Dr. – Em geral, o RGE melhora com a idade, o que coincide com a introdução de alimentos como as frutas e papinhas. Entretanto, esses alimentos, assim como as fórmulas lácteas AR (anti refluxo), realmente diminuem a eliminação de alimentos pela boca, o que pode favorecer o ganho ponderal em crianças com essa dificuldade. Por outro lado, existem trabalhos que mostram que apesar de o alimento não ser eliminado, pode permanecer mais tempo no esôfago, aumentando o contato de ácido com a mucosa desse órgão.

 

K – Qual a melhor forma de diagnosticar? Sintomaticamente ou por exames?

Dr. – A melhor forma de diagnosticar o RGE é clinica. Porém, às vezes ocorre um refluxo dito oculto e nesses casos serão necessários a realização de alguns exames, que dependendo da suspeita clínica o medico pode optar por: radiologia com contraste, cintilografia com radio isótopos, pH-impedanciometria ou ainda endoscopia.

 

K – Qual é o tratamento mais eficiente? Postural ou medicamentoso? Ou há, ainda, algo diferente a se fazer?

Dr. – Deve-se sempre dar preferência ao tratamento não medicamentoso, preferindo o postural e fracionamento das refeições. Entretanto, se o problema persistir, a associação com medicamentos pode ser útil.

 

K – Qual a idade ideal para tratar o refluxo? Bebês com menos de 6 meses podem/devem ser tratados?

Dr. – A grande maioria dos RGE são fisiológicos e não necessitam tratamento. Quando o RGE causa algum problema, como dificuldade em mamar, dor, déficit de crescimento ou doença respiratória, chama-se Doença do RGE e necessitam ser tratados, independentemente da idade.

 

K – Uma criança com refluxo pode levar esse problema para a frente ou conforme vai ficando mais velho o problema desaparece?

Dr. – Na grande maioria das crianças, o RGE desaparece com a idade. Em alguns casos, dependendo do tipo de “problema”, o RGE pode demorar bastante tempo e em alguns podem ser necessária a correção cirúrgica.

 

Dicas para as mamães

–  Mantenha sempre a cabeceira do berço ou da cama mais elevada, para que a ação da gravidade ajude o esvaziamento gástrico.

–  Fracione a alimentação do bebê para que o estômago não distenda e o refluxo seja evitado: a quantidade de alimentos deve ser menor  por vez, durante mais vezes ao dia.

–  Alguns alimentos devem ser evitados, como gorduras, frituras, chocolate, sucos cítricos, café, refrigerante e iogurte.

–  A amamentação do leite materno é essencial, assim como deixar a criança no colo “em pé”, para arrotar depois de alimentada, por pelo menos meia hora antes de deitá-la.

 

Colaboraram com a entrevista as mamães Luciana Panzuto, Celina Marcolino, Bianca Buzo Carvalho e Simone Miranda. 

 

 

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